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Maputo
Ao mesmo tempo que vemos as empresas discutirem a questão da sustentabilidade, temos frequentemente na mídia uma chamada de atenção à questão do uso excessivo de matérias-primas e acompanhamos campanhas de utilização mais racional dos bens naturais, temos os produtos chineses ganhando cada vez mais espaço.
E qual é a característica desses produtos chineses? Justamente sua não sustentabilidade, o disperdício de matérias-primas em algo que vai durar muito menos do que o necessário e, portanto, vai precisar ser reposto, gastando novas matérias-primas, energia para a produção, transporte, etc. Moçambique abriga muitos imigrantes chineses. Cerca de 20 mil. Muitos deles empresários e a maioria trabalhadores da construção civil. São tantos que já se fala em criar um bairro chinês, que deve ser erguido no distrito de Catembe, em Maputo. O problema é que trazem com eles a cultura do descartável, do produto mais ou menos, só para resolver por agora, porque depois se compra outro. E isso em todas as instâncias. Inclusive na construção civil. Todos aqui já sabem que obra feita por chinês é edifício para viver em manutenção. No ano passado foi reinaugurado o famoso Hotel Polana. Os chineses pegaram um prédio antigo, com muitos problemas de conservação, para reformar. Entregaram um hotel novo (de gosto duvidoso em alguns aspectos, mas novo). Dois meses depois, no vestiário já se via ladrilhos rachados e em todo o hotel os chineses andavam às voltas com pequenos reparos. O aeroporto de Maputo também foi reconstruído. Fizeram um novinho ao lado do anterior, que era bem antigo, ainda todo em madeira, escuro, cara de aeroporto anos 40. O novo é todo cheio de vidro, ladrilhos claros, muito laminado, tudo produto chinês, claro. Mão-de-obra, idem. Antes mesmo de inaugurar, já havia notícias de infiltração. Mês passado foi inaugurado o estádio nacional do Zimpeto, em Maputo. Será palco dos Jogos Africanos, que acontecerão por aqui em setembro desse ano. A inauguração foi em grande estilo, com jogo da seleção de futebol de Moçambique contra a da Tanzânia. Mas, como foi dito em notícia do site CanalMOZ, nem tudo foi brilho na inauguração. No dia seguinte, pessoas que estiveram no local relatavam sobre cadeiras quebradas e detalhes mal feitos do acabamento daquela que seria a mais moderna infraestrutura desportiva construída no país após a Era colonial. E a prática não se restringe à Moçambique. Outro dia ouvi na rádio RDP África a notícia de que partes do reboco do teto do mercado Coco Coco, de São Tomé e Príncipe desabaram. O mercado foi reconstruído há alguns meses, por chineses, por meio de um financiamento de US$ 5 milhões oferecido pelo governo chinês ao governo local. Aqui em Moçambique a lógica para eles estarem em quase todas as obras também é a unicamente econômica, como parece ser em São Tomé e Príncipe. Ou o governo chinês financia ou as empresas chinesas ganham as licitações (concursos, como se diz aqui) por oferecerem o melhor preço. E, no ato do contrato, exigem que tudo, absolutamente tudo, venha da China (do material – até mesmo o mais sensível como vidro – à mão-de-obra). Como citei no texto Um outro estágio evolutivo, vivemos aqui em África um estágio evolutivo de democracia, gestão e administração muito diferente do que temos em outros lugares. Aqui ainda não se discute, por exemplo, a questão da sustentabilidade, menos ainda de gestão empresarial com foco nisso. O que pode até ser compreensível em uma realidade onde as pessoas estão preocupadas em ter como se sustentar no almoço de hoje. Mas, apesar disso, é preciso ter muita cautela. Quantas mortes, acidentes ou reconstruções terão que acontecer para perceberem que nem sempre o preço mais baixo é o melhor, especialmente quando se trata de construção civil? Veja também o que Eduardo Castro já publicou sobre o tema. Sandra Flosi
1 Comment
Fernando Cruz
8/10/2011 08:10:42 am
O livro, ainda em inglês, acho eu "Poorly made in China" de Midler, vale a pena ler para compreender o megafenómeno da proliferação dos productos chineses pelo mundo.
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